terça-feira, 4 de maio de 2010

O Dia da Lua


A ampulheta digital impõe o que lhe foi acordado.

Olho entrecruzado,  

busco um ângulo pra cara amarrada.

Ignoro, vocifero, viro pro lado.

Suspiro - inquieto -, reconsidero, 

a hora é pesada.

Passo sonolento de chinelo arrastado.

Segunda-feira.

Endomingado...

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Panóptico.


FACULDADE PORTO-ALEGRENSE DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS E LETRAS
CURSO DE LETRAS

TEORIA LITERÁRIA II - Exercícios 1ª unidade 
Professora: Drª Ana Maat Ribeiro



1 - Pra que serve o poema?

Leia o poema de Drummont e responda a questão acima, exegese catedrática. Tu deves construir teu tirocínio discente, loquacidade de atestado, dissecar tua sina, não esquece. Pesa os aspectos intrínsecos e extrínsecos de análise estudados (se é que ainda não fostes petrificado em tantas medusas-verdades):


A Bunda, que Engraçada 

A bunda, que engraçada.
Está sempre sorrindo, nunca é trágica
Não lhe importa o que vai
pela frente do corpo. A bunda basta-se.
Existe algo mais? Talvez os seios.
Ora - murmura a bunda - esses garotos
ainda lhes falta muito que estudar.
A bunda são duas luas gêmeas
em rotundo meneio. Anda por si
na cadência mimosa, no milagre
de ser duas em uma, plenamente.
A bunda se diverte
por conta própria. E ama.
Na cama agita-se. Montanhas
avolumam-se, descem. Ondas batendo
numa praia infinita.
Lá vai sorrindo a bunda. Vai feliz
na carícia de ser e balançar.
Esferas harmoniosas sobre o caos.
A bunda é a bunda,
redunda 


O gênero lírico se constitui através da tácita manifestação do simulacro eu lírico, que expressa sua hermenêutica da realidade a partir de uma percepção interior, emocional, individualizada. Esforça-te na maiêutica como de praxe. Lembra-te da sorrateira dualidade entre o autor e o eu lírico, mesmo em osmose antrópica, há visão em paralaxe.


2 - O gênero e a forma de comunicação que o eu lírico estabelece com o leitor. 

Observe o poema de Adélia Prado: o ritmo, sentido das palavras, o aspecto gráfico, do título significado. Elabore uma conclusão a respeito do gênero supra-citado e da forma de comunicação que o eu lírico estabelece com o atônito leitor. Lembra-te, literatura se faz com palavras vivas, necropsia com palavras mortas. Busca no cemitéiro da semiótica a anatomia  da  verdade. Sintaxe e semântica, verossimilhança, em busca da uma objetividade para que a doença não nos destrua:

Explicação de poesia sem ninguém pedir

Um trem-de-ferro é uma coisa mecânica,
mas atravessa a noite, a madrugada, o dia,
atravessou minha vida,
virou só sentimento.


3 - De onde se origina o poema? Como ele dialoga com a tradição da lírica e com o seu tempo? 

 Leia os dois poemas abaixo e responda à questão acima (nota mental: meu Deus, por que me abandonaste!) considerando a posição do eu lírico e o que se oculta nos enleios tortuosos da verdade. Atenta à intertextualidade, simbiose  fecunda, ornamentada, rotunda, por feéricos seres de muitas faces. O processo de construção e virtual desconstrução da lírica - mesmo que possesso pela vontade de verdade - em sua mais tenra versão idílica, seus aspectos estruturais e sua íntima relação com o olhar-representação da realidade:


Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.


 
Poema de sete faces 

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.